Fantasia Lusitana, por Tiago Ramos



João Canijo sempre se mostrou como um dos realizadores portugueses que melhor retrata o país em que vivemos. E dentro desse espírito retratista, sempre primou pelo sentido crítico que imprime nas suas obras, algumas delas bastante trágicas como o caso de Noite Escura (2004) e Mal Nascida (2007). Saindo da ficção e centrando-se num documentário, inicialmente sugerido como sendo sobre os refugiados em Portugal nos anos 40, João Canijo imprime o seu cunho pessoal numa obra que só pelo seu título - Fantasia Lusitana - indica qual o seu objectivo.



João Braz, montador de Alice (2005), faz um trabalho virtuoso sob a direcção do realizador (juntamente com toda a equipa responsável pela pesquisa) em seleccionar e editar as imagens e testemunhos. E são precisamente essas imagens que fazem a ideia funcionar, elas falam por si, estabelecem o contraponto entre a sociedade salazarista do pós-Segunda Guerra Mundial e a sociedade contemporânea.

«Tudo pela nação», assim começa e de uma forma subtilmente irónica, o retrato de uma propaganda que vendia Portugal como um país de paz e neutralidade, numa altura em que era um ponto de passagem para inúmeros estrangeiros e refugiados. As imagens de um Portugal triunfante em contraponto aos testemunhos reais e à narração, criam um equilíbrio interessante entre aquilo que era dado a crer e a realidade da situação portuguesa. O Fado, o Futebol e Fátima. Os três efes que faziam de Portugal um país aparentemente melhor e que subitamente se havia tornado cosmopolita, uma espécie de circo mediático, com direito a exposições de cariz mundial, onde o engenho e a arte portugueses eram celebrados.



E num país onde todos eram fingidores, não deixa de ser irónico que sejam precisamente os estrangeiros a encontrar, neste local, um sentimento de irrealidade. Os testemunhos de nomes como Antoine de Saint-Exupéry e Alfred Döblin revelam que, na verdade, a imagem passada para fora era que, para além do calor, do património cultural, não havia nada. Havia apenas um país de pessoas excêntricas, quase primitivas, onde o ruído era insuportável e onde homens, mulheres e crianças cuspiam no chão. Um desfile, uma parada de suposições, de fantasias, de um povo por demais iludido.

Não deixa de ser também irónico - e sem querermos desenvolver quaisquer pretensões políticas - que o sentimento que se gera no espectador (mesmo o que não viveu na época relatada no docuemntário) é o de identificação com a época e com as imagens. É este contraponto à propaganda do Estado Novo e à situação portuguesa actual que faz de Fantasia Lusitana um retrato irónico, mas acutilante, do povo português. E daí que nos faça bem, por vezes, rirmo-nos de nos próprios e termos a partir de filmes como este, um ponto de reflexão para o futuro.

Título original: Fantasia Lusitana (2010)
Realização: João Canijo

Duração: 67 minutos
Tamanho: 952.2 MiB
Formato: AVI

Vídeo
XviD | 1771 Kbps | 640x496 | 25 fps

Áudio
AC3 | 192 Kbps | 48 Khz | 2 Ch | Português

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